terça-feira, 28 de outubro de 2008

Noite de sonhos voada


Noite de sonhos voada
cingida por músculos de aço
profunda distância rouca
da palavra estrangulada
pela boca amordaçada
noutra boca
ondas do ondear revolto
das ondas do corpo dela
tão dominado e tão solto
tão vencedor, tão vencido
e tão rebelde ao breve espaço
consentido
nesta angústia renovada
de encerrar
fechar
esmagar
o reluzir de uma estrela
num abraço
e a ternura deslumbrada
a doce funda alegria
noite de sonhos voada
que pelos seus olhos sorria
ao romper de madrugada:
— Ó meu amor, já é dia!...


Manuel da Fonseca

Desde quinta-feira passada que este poema não me sai da cabeça. E que me faz lembrar este outro, de Eugénio de Andrade. Aqui, na voz de Simone de Oliveira.

Adeus
Como se houvesse uma tempestade
escurecendo os teus cabelos,
ou se preferes, a minha boca nos teus olhos,
carregada de flor e dos teus dedos;

como se houvesse uma criança cega
aos tropeções dentro de ti,
eu falei em neve, e tu calavas
a voz onde contigo me perdi.

Como se a noite viesse e te levasse,
eu era só fome o que sentia;
digo-te adeus, como se não voltasse
ao país onde o teu corpo principia.

Como se houvesse nuvens sobre nuvens,
e sobre as nuvens mar perfeito,
ou se preferes, a tua boca clara
singrando largamente no meu peito.

1 comentário:

Carla disse...

Ao ler um poema sentimos algo que nos comove, mas ao ouvi-los, ainda para mais na linda voz da Simone de Oliveira... it's overwhelming!!! :)